segunda-feira, outubro 24

Fora do Normal - Capitulo 1


Capítulo 1

Completamente secante. Uma tremenda pasmaceira. Aborrecimento 100%. Domingo à tarde, amanhã será segunda e aqui estou eu, sentada em frente ao portátil a ver fotos. Fotos das minhas poucas memórias. Quando perdemos alguém o nosso maior medo é esquecer. E é verdade, esquecesse. Ficam apenas fragmentos da verdade e buracos de momentos.
Não dá nada de jeito na televisão. Ainda não está frio o suficiente para me apetecer ler, e nunca tive grande dom para a escrita. Subi as escadas até ao meu quarto, e liguei o portátil. O portátil que tanto implorei para ter, e que não recebi o modelo por mim escolhido. Será possível que não tenho uma música que queira? Escolhi uma das minhas preferidas e meti para tocar enquanto fui tomar banho.

- Laura?! - ouvi o meu pai gritar.
- Viva! - o pai, desde a morte da mãe, tinha a mania de gritar o meu nome quando chegava a casa, acho que era para saber se eu me tinha suicidado ou não.
- Deixa-te de brincadeiras! Desce, vamos comer, já é tarde!
Desci as escadas sem grande emoção já com o meu pijama vestido.
- Não tens frio?
- Não. A casa está quente.
- Está a chover. Bem avisaram que viria esta tempestade. - refilou.
- Hum… - estava sem nenhum interesse para a conversa sobre o tempo.
- A tua avó mandou-nos lasanha, ainda está quente. Serve num prato e vamos comer. - pediu. Coloquei um pouco para mim e para ele, e sentámo-nos à mesa. - O que fizeste hoje?
- Nada de especial. TV, portátil, TV, comi, ouvi musica, mais TV, portátil e TV. Como podes ver. Nada de especial.
- Amanhã tens escola.
- Nem me lembres… - balbuciei.
- Por favor, querida, não provoques as tuas colegas.
- Eu não provoco defendo-me mas como todos preferem que as ‘princesas’ tenham a razão…
- Estou a pedir-te, Laura. - levantou um pouco a voz.
- Vou tentar.
- Sei que sim. - beijou-me a testa. - Vou vestir o pijama e cama. Tu o mesmo. Até amanhã.
- Até amanhã. - despedi-me.
(…)
Segunda-feira, ótimo! Estou muitíssimo entusiasmada. E muito mentirosa hoje.
- Laura vais te atrasar! - ia começar os gritos da manhã. Talvez se eu ficar deitada ele pense que estou doente. - Escusas de pensar que vou acreditar em algum tipo de doença! - talvez se eu fingisse vomitar. - Mesmo que vomites! - Perfeito… O meu pai é um leitor de pensamentos.
Levantei-me de má vontade e abri como um verdadeiro zombie o armário, retirei a minha roupa, e fui até à casa-de-banho. Tomei um duche rápido, lavei os dentes, escovei o cabelo, e vesti-me. Agarrei na minha mala e óculos e saí do quarto.
- Bom dia. - entregou-me o pacote de leite.
- Só se for para ti.
- Vamo-nos atrasar. Bebe o leite agarra numa barra de cereais e vamos. Não me posso atrasar para o escritório. - bebi o leite diretamente do pacote, agarrei na barra de cereais e segui-o até ao carro. O meu trabalha num escritório de advogados muito conhecido nacional e internacionalmente. A minha mãe era escritora, amava ler. Depois de ela ter morrido nunca mais agarrei numa caneta para escrever o que me ia no coração. Nem mesmo entrei na sua pequena biblioteca.
Entrei no BMW preto e fomos até à escola. Nem conseguia acreditar que ia começar mais uma semana dentro daquela prisão. O carro parou a alguns metros do portão da escola, o qual fiquei agradecida, e saí do carro.
- Vemo-nos em casa. - disse de dentro do carro. Apenas acenei e fui para o portão. Ele não se ia embora até eu entrar, por isso.
Toda a escola era horrível. Odiava todos os que estavam dentro dela. Claro que havia exceções como a Prof. Eduarda, de Português, ou o Sr.Luís, o porteiro da escola. Sabem quando se odeia tanto algo que tudo o que lhe pertence fica mil vezes pior? Pois é assim que me sinto dentro disto. Como habitual assim que entrei todos ficaram a olhar. Pessoas tão típicas… Agarrei no meu iPod e coloquei-o a tocar.
Sentei-me, como sempre, no chão perto do muro atrás de toca a escola onde o Sol batia de manhã, e aquecia-me. O tempo andava horrível. O Outono parecia querer chegar mas havia alturas de Verão. Hoje era um desses dias. Podia sentir o calor a pairar. Retirei da minha mala o caderno preto, conhecido por os antigos poemas que escrevia com a minha mãe. Um papel caiu de dentro do caderno, assim que o apanhei reconheci-o. Era a foto da minha mãe.
Sorriso brilhante, bochechas avermelhadas, olhos meigos, e um cabelo grande, volumoso. Era tão bonita, tão jovem. Porque levá-la já? Levas as mais novas e Deixas ficar as mais velhas. Uma mulher de coragem, bravura e poder. Uma mãe com tanto carinho para dar.
Senti no meu rosto algo molhado. Uma lágrima escorria. Limpei rapidamente e recompus-me. Eu não poderia ser fraca neste lugar. Aqui eu não era a Laura que queria a mãe, nesta escola eu era a Laura Reinol, a interna gótica-rebelde. Olhei para o telemóvel, faltavam alguns segundos para o toque de entrada.
A imagem dela não me saia da cabeça. O sorriso, os beijos de boa noite, as compras, as nossas discussões, as nossas brincadeiras. Eu precisava dela. Entrei na sala e fui para a mesa mais afastada. Eu era a única que ficava sozinha na mesa. E com alguma sorte ninguém se sentaria a meu lado.
Todos começaram a entrar, e olhar-me de lado. A professora de Ciências entrou, a Sr.ª Daniela Ferroso.
- Bom-dia turma.
- Bom-dia. - todos os outros responderam.
- Abram o vosso livro na página… - e começou o inferno. Abri o livro na página desejada e comecei a rabiscá-la. Não era má aluna. Tinha notas razoáveis. Por estranho que parecesse… Podia não tomar atenção nas aulas mas os próprios livros explicavam muito bem.
‘No dia em que tudo mudou…’, era o tema da redação que a professora Eduarda tinha pedido. A minha apenas tinha uma frase. ‘No dia em que tudo mudou, pensei poder voltar ao normal, mas entendi algo. Será impossível!’ É claro que a stora deu negativa, e aconselhou-me a ir à psicóloga da escola. Mas mais tarde entendeu que isso não resolveria nada.
Três bateres na porta atraíram a minha atenção, tal como toda a turma.
- Desculpe, posso entrar? - perguntou uma rapariga com ar demasiado inocente para o meu gosto. O chamado ‘pãozinho sem sal’.
- Claro que sim, posso ajudá-la?
- Sou nova nesta escola. - deu de ombros. Tinha olhos pequenos, cabelos morenos compridos, e roupa do século passado.
- Oh, sim. Fui informada disso. Como é o teu nome? - perguntou a stora.
- Margarida Santos. - respondeu-lhe.
- Senta-te numa mesa. - pediu.
Constança e Irene começaram a coscuvilhar sobre a novata enquanto o terceiro membro das ‘princesas’ colocava a mala em cima da cadeira ao seu lado na mesa. A rapariga sentou-se então no único lugar disponível, ao meu lado. Olhou para mim com medo, mas nem lhe respondi, apenas fiquei na minha.
- Sou a Margarida e tu? - tentou meter conversa.
- Olhem, olhem, será desta que a bruxa vai ter uma amiga? - ouvi a voz da Constança, a maior manipuladora possível, e que ninguém o via ser.
- Vê lá se a bruxa não te lança um feitiço. - lancei-lhe uma resposta.
- Meninas! - chamou à atenção a stora. Esquece a tansa, esquece-a. Olha o que o pai avisou… Pensava comigo.
O sinal de saída tocou e fui até aos balneários onde teria a minha próxima aula. Este ano para poupar nos professores de Educação Física foi decidido um professor dar aulas a duas turmas do mesmo ano. Assim o custo era menor e os alunos interagiam mais com outros colegas, diziam eles.
Vesti as calças de fato de treino e uma camisola larga e caminhei até ao pavilhão.
- Ainda bem que vestis-te essas calças, ninguém quer ver os canivetes que são as tuas pernas. - Constança mandou a boca assim que me viu sentada no banco.
- Acho melhor então vestires umas também. - a ‘princesa’ ficou vermelha de raiva, mas limitou-se a ignorar-me. Ela nunca ia aprender a não falar comigo.
O grupo de Constança, ou como gosto de chamar o Trio Purpurina, veste-se sempre de igual para as aulas de Educação Física, mas claro que a líder tem que ter mais purpurina. A nova aluna entrou junto com algumas pessoas da outra turma e sentaram-se.
- Bom-dia. - cumprimentou o Stor Bonzão, ou Samuel, como preferirem. Este ano era a primeira aula de Física, já a toda a confusão com os horários. - O meu nome é Samuel e vou ser vosso professor de EF. Para me darem as boas vindas quero 15 voltas ao campo, a correr e duas a andar. Vamos, bora, bora!
Levantei-me num transe melancólico e mexi as pernas para correr.
- Olá de novo. - a rapariga nova estava ao meu lado. - Há pouco não conseguimos falar muito bem. Sou a Margarida, já ouvi falar muito de ti. Laura, não é?
- Se eu disser sim, vais calar-te?
- Possivelmente não. Saí à minha tia a falar muito. Acho que é coisa de família. - bonito… Ela não deveria ser tímida? Pelo menos foi o que eu pensei.
- Hum… - foi a única coisa que fiz.
- Já percebi que não falas muito, não tem problema, eu falo por nós duas. Garanto-te que vamos ser boas amigas. Posso até apresentar-te alguns amigos meus. Vivo num prédio, por isso conheço muita gente daqui. Especialmente da outra turma. São simpáticos.
- Margarida, menos conversa, mais ação. - gritou o Stor Bonzão do outro lado do pavilhão. A rapariga calou-se mas manteve-se a meu lado mandando sorrisinhos cúmplices. Será que ela era tão idiota assim para não se manter afastada?
A corrida finalmente parou e eu mal me aguentava em pé, estava sem folgo nenhum. Já a minha nova ‘amiga’ estava ótima. Continuava a falar, e falar, e falar. Esta rapariga não sabia o que era silêncio?
- Vamos fazer equipas. Equipa 1: Rita, Joana, Irene, Jaime, Paulo e Rui. Equipa 2: Constança, Mateus, Margarida, Filipe, Laura e Dinis.
O meu pensamento? Mas que porra de azar que tenho. A senhora faladora, e a ‘purpurinada’ na mesma equipa.
O Stor Bonzão colocou-nos a jogar contra a equipa 3.
A bola de futebol veio parar aos meus pés, e quando um dos rapazes da outra equipa me veio tirá-la quase caí no chão. Quase… Senti mãos agarrarem a minha cintura.
- Estás bem? - perguntou-me.
- Melhor impossível. - levantei-me rapidamente, ajeitei a roupa e voltei ao meu lugar.
O rapaz ficou a olhar-me pelo canto do olho. Qual é o problema agora? Nunca viu?
- Guidinha, Guidinha. - Constança, na outra ponta do pavilhão já chateava a novata. - Não sabes calar essa boca grande não?
A rapariga nova encolheu-se e ficou vermelha de vergonha. Porque os stores nunca viam estes momentos?
- Para aprender a falar mal de ti. - balbuciei.
- Qual é o teu problema bruxa?
- Tu. - respondi-lhe apenas.
- Vi a queda que ias dar. Tudo muito bem feito para o Mateus pensar que foi sem querer. - mandou ao ar. O stor deu o apito de intervalo.
- Não sou igual a ti para fazer isso.
- Já percebi a tua tática. Olhem para mim, sou tão coitadinha, sou órfã de mãe. Uan… Uan… Quero a mamã… - fingiu chorar.
Deixei para o lado a promessa feita ao meu pai e saltei para cima dela, disparando em estalos, murros, pontapés e muito mais. Aquela megera tem que aprender a não mandar veneno para fora, e fechar a boca antes de falar da minha mãe.
- Laura larga-a! - gritou o stor.
- Assassina, assassina! - gritavam Irene e Mariana.
- TU VAIS MORRER!!
- LARGA-ME SUA LOUCA!!
Alguém me agarrou para longe daquela megera.
- CHEGA! As duas, para o diretor!!! - mandou o stor. Irene, Mariana, levem para a enfermaria a Constança. Mateus, Margarida levem a Laura para o diretor.
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O primeiro capitulo está aqui. Não está muito bom, eu sei. O tempo é pouco... Comentem, digam o que acharam e o que querem ver mais por estes lados.

Beijos,

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